Em um novo caso que coloca em evidência a relação entre consumidores e grandes estabelecimentos comerciais, o Central Plaza Shopping Center e a empresa responsável pela administração de seu estacionamento, Indigo, estão enfrentando uma ação judicial de um cliente que se sentiu lesado por práticas abusivas. O caso envolve a repetida retenção de seu veículo, que teve sua roda travada sempre que estacionado no shopping, ferindo, segundo a acusação, o direito de ir e vir, garantido pela Constituição Federal.
Essa situação levanta uma questão fundamental: até onde as empresas podem ir ao criar normas internas e quais são os limites quando o direito básico de locomoção do cidadão é restringido? Vamos entender os detalhes do caso e as implicações jurídicas dessa prática.
O início do problema: um veículo, muitas travas
No mês passado, o Requerente Jonatas Lucena, proprietário de uma caminhonete L200, passou a enfrentar um problema recorrente e frustrante ao estacionar seu veículo no estacionamento do Central Plaza Shopping, que é administrado pela Indigo, empresa conhecida por gerenciar diversos estacionamentos na cidade de São Paulo. O consumidor, que utiliza o shopping principalmente pela proximidade com a estação Tamanduateí do metrô, relatou que, todas as vezes que retorna para pegar o veículo, encontra a roda dianteira travada por um dispositivo colocado pela administração do estacionamento.
Essa prática se repetiu diversas vezes, o que levou o Requerente a questionar os funcionários da empresa. A resposta, no entanto, nunca foi satisfatória. O único argumento apresentado pelos funcionários foi de que estavam “apenas cumprindo ordens”, mas em momento algum foi apresentada qualquer legislação ou regulamento que justificasse a imposição da trava.
Essa falta de transparência e o constante desconforto gerado levaram o advogado Jonatas Lucena a tomar medidas mais enérgicas para proteger seus direitos como consumidor e como cidadão.
O direito de ir e vir ameaçado
O ponto central da ação indenizatória movida pelo advogado e Requerente Jonatas Lucena é o entendimento de que a prática adotada pelo Central Plaza Shopping e pela Indigo fere um dos direitos mais fundamentais da Constituição: o direito de ir e vir, garantido pelo artigo 5º, inciso XV. Este direito assegura que qualquer cidadão tem a liberdade de se locomover em território nacional sem ser impedido de forma arbitrária.
A questão ganha ainda mais relevância quando se leva em consideração que o veículo do Requerente não estava estacionado em locais irregulares ou em áreas reservadas para vagas preferenciais. Segundo Jonatas Lucena, ele sempre cumpriu as normas de estacionamento estipuladas pelo shopping, como pode ser comprovado por imagens registradas recentemente e anexadas ao processo.
Portanto, a trava imposta ao veículo não parece ser uma medida para punir o mau uso das vagas, mas sim uma sanção administrativa sem base legal, aplicada por uma empresa privada. Nesse sentido, é possível questionar até que ponto uma empresa particular tem o direito de restringir, ainda que temporariamente, o uso do veículo de um cliente, sem respaldo legal ou regulamentar.
Tentativas de solução amigável frustradas
Antes de recorrer ao Poder Judiciário, o Requerente tentou resolver a questão de maneira amigável. Ele enviou uma notificação formal, por e-mail, ao Central Plaza Shopping e à Indigo, solicitando que cessassem a prática de travar seu veículo, uma vez que tal medida não só era injustificada como ilegal.
Em resposta, o Central Plaza Shopping afirmou não ter conseguido entrar em contato com o Requerente, alegando dificuldades em localizar o número de telefone fornecido. No entanto, o Requerente afirma que essa informação é falsa, pois nunca recebeu qualquer tentativa de contato. Já a Indigo, responsável direta pela administração do estacionamento, não respondeu à solicitação do consumidor.
E-mails enviados e respostas, ou a falta delas, foram anexados ao processo como prova de que os responsáveis pelo shopping e pelo estacionamento não demonstraram interesse em resolver a questão de forma rápida e eficiente.
O uso ilegal de travas em veículos: uma prática arbitrária
O uso de travas em veículos estacionados é uma prática que, em teoria, pode ser justificada por razões de segurança ou para evitar o mau uso de vagas em áreas restritas. No entanto, esse não parece ser o caso aqui. O Requerente alega que, em todas as ocasiões, estacionou seu veículo de maneira correta e respeitosa, sem causar qualquer obstrução ao trânsito de outros veículos ou desrespeitar as normas do shopping.
A trava, portanto, surge como uma forma de sanção administrativa imposta pela Indigo, uma empresa particular, o que levanta questionamentos jurídicos importantes. Não há dúvida de que o poder de restringir o uso de um bem, como um veículo, é uma prerrogativa do Estado, através de seus órgãos de fiscalização, como a polícia de trânsito. Quando uma empresa privada adota essa prática sem respaldo legal, isso pode configurar um abuso de poder.
A ação movida pelo Requerente tem como um dos fundamentos centrais a afirmação de que o uso das travas constitui uma restrição parcial ao exercício do direito de locomoção, o que é vedado pela Constituição. Além disso, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) já prevê as sanções cabíveis para o caso de estacionamento irregular, como advertências, multas e, em casos mais graves, a remoção do veículo.
Portanto, ao impor uma trava sem justificativa legal, a empresa administradora do estacionamento extrapola suas competências e fere diretamente os direitos do consumidor.
O dano moral é outro ponto central da ação movida pelo Requerente. A retenção do veículo não apenas causou atrasos e aborrecimentos diários, mas também gerou uma série de constrangimentos públicos. Jonatas Lucena relata que, em diversas ocasiões, teve que aguardar a chegada de um funcionário da Indigo para desbloquear seu veículo, enquanto era observado por outros clientes do shopping, o que lhe gerava um desconforto evidente.
Essa situação de espera, somada à imposição arbitrária da trava, criou um cenário de humilhação, onde o advogado se sentia tratado como se estivesse cometendo uma infração grave. O sentimento de impotência e a exposição pública contribuíram para agravar o impacto emocional da situação.
O dano moral, portanto, se configura não apenas pelo aborrecimento diário, mas pelo fato de que a ação dos Requeridos feriu diretamente a dignidade e a imagem do Requerente, tornando-o objeto de olhares de reprovação de terceiros, como se estivesse em situação de irregularidade, quando, na verdade, estava apenas exercendo seu direito de estacionar seu veículo de maneira legítima.
A busca por justiça: O pedido de indenização
Diante das constantes violações a seus direitos e da falta de resposta adequada por parte do Central Plaza Shopping e da Indigo, o Requerente optou por acionar a Justiça em busca de reparação. A ação indenizatória tem como objetivo não apenas garantir o direito de estacionar seu veículo sem sofrer sanções arbitrárias, mas também obter uma compensação pelos danos morais sofridos.
A prática ilegal adotada pelas Requeridas é uma violação clara aos direitos do consumidor e, em última instância, ao próprio princípio da dignidade da pessoa humana. O Requerente busca não apenas uma compensação financeira, mas também uma decisão judicial que impeça que tais práticas continuem ocorrendo, garantindo que seu direito de locomoção seja respeitado.
Uma luta pela defesa dos direitos do consumidor
O caso de Jonatas Lucena contra o Central Plaza Shopping e a Indigo levanta questões fundamentais sobre os limites da atuação de empresas privadas no controle de suas áreas de estacionamento e, principalmente, sobre o respeito aos direitos do consumidor e aos direitos fundamentais garantidos pela Constituição.
A imposição de travas em veículos, sem base legal ou justificativa plausível, configura uma prática abusiva que não pode ser tolerada em um Estado democrático de direito. A ação judicial em curso busca não apenas a reparação pelos danos causados, mas também serve como um alerta para outras empresas que possam adotar medidas semelhantes. É essencial que o consumidor esteja ciente de seus direitos e que eles sejam respeitados em todas as esferas, seja no ambiente de compras, seja no estacionamento de um shopping.